Tuesday, December 21, 2010

Escravos.

O mundo estava parado para a mulher, a não ser por duas coisas; o ventilador que girava lentamente e os segundos do seu relógio que insistiam em continuar mudando de forma crescente.
Ela olhava para o celular e em seguida para o telefone e pensava que já fazia dois dias que eles não tocavam. Quando tocavam não era quem ela esperava.
Lembrou-se do último contato e das palavras, tentou dentro do diálogo encontrar culpados pela distância.
A primeira vista nada foi encontrado, a não ser ao lembrar que ele disse que ela estava deixando de se importar com as pessoas que disse serem importantes para ela num passado não tão distante.
"Menino insolente." - Ela pensou, no entanto resolveu explorar mais o assunto e enxergou que a rispidez do homem foi resposta as palavras dela, as quais não foram as mais doces.
Lembrou-se em tê-lo dito que ele estava pressionando-a, querendo uma atenção que ele não tinha o direito de cobrar. Disse-lhe também que estava se afastando dele, devido ao cara chato que ele havia se tornado. Lembrou também da pergunta dele: "Qual a maneira d eu me aproximar de alguém que está se afastando de mim?" E se recordou que ela disse que conforme ele fosse voltando a ser legal ela iria voltando aos poucos a querê-lo por perto.

Irônica a vida, terrivelmente irônica.
Como ela iria ligar para ele perguntando o porque dele ter sumido depois de reclamar dele quanto a esse mesmo questionamento?
"Somos escravos de nossas palavras, senhorita." era o que ele falava quase sempre para ela. Agora ela entendeu o que isso queria dizer, compreendeu que ele só sumiu porque ela o repeliu.
A senhorita passou a mão nos cabelos, pegou o celular e começou a mexer nele. Foi em 'ligações recebidas' e viu que lá não tinha uma dele há tempos. Em 'mensagens' o nome dele não aparecia mais.
Lembrou-se dos períodos de silêncio que existiam quando ela acabava de falar, quando a unica coisa que se ouvia do outro lado da linha era a respiração dele. Quando ela questionava qual o motivo do silêncio ele puxava ar e respondia sempre que estava pensando.
As últimas palavras dela para ele foram "Então digeri aí o que falei depois nos falamos." Ouvi-se um murmúrio do outro lado da linha, parecido com o que ele fazia quando sorria.
Ele disse 'a gente se vê' ao desligar o telefone. A jovem sempre soube que ele era sincero e fazia valer suas palavras, mas temeu que pela primeira vez ele se usou da retórica para não ser rude com ela no último diálogo que teriam.

1 comment:

  1. Não irei cansar de parabenizá-lo! Mais um texto incrível que traz uma reflexão profunda!

    "O que eu poderia fazer se estivesse em uma situação como essa?"

    Devemos pensar nas palavras antes de serem ditas porque de fato seremos escravas delas.

    Lindo texto!

    Beijos!

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