Monday, June 27, 2011

Movimento

Se você é sedentário, sabe do que falarei agora:
Sabe quando você tenta encostar os dedos das mãos no pé, estando em pé, e não consegue, pois a coluna não dobra nem as pernas param de queimar de tanta dor?
Então, estou tão limitado quanto você, a diferença é que eu não sinto a queimação, mas pode acreditar, preferiria muito mais essa queimação que nada (que é o que tenho).
Mesmo com uma rotina de muitas fisioterapias os anos de cadeira acabam que enfraquecendo em demasia os músculos.
A rotina de exercícios é diária, para que assim os músculos continuem sendo exigidos, ajudando assim no meu processo de reabilitação.
Há mais ou menos um mês eu comecei a fazer uma fisioterapia "especial". Lá têm equipamentos que ajudam a desenvolver o movimento de forma precisa, o que começou a apresentar resultados incrivelmente significativos.
Para conseguir ilustrar o momento, imagine uma sujeito que está em uma cadeira de rodas há mais ou menos 5 anos conseguindo quase que sozinho pedalar uma bicicleta.
Eu estava indo todo dia para São Paulo fazer esse tratamento, gastando em média mil reais por semana.
Como um sujeito tetraplégico não consegue trabalhar, nem seus familiares conseguem ter uma vida sobre-humana para trabalhar mais e assim conseguir o dinheiro, eu tive que diminuir minhas idas ao tratamento.
Sequelas de acidentes, creio eu, não tem critério de escolha, geralmente vem quando há alguma imprudência antecessora. Mas isso não vem ao caso, o presente é que conta e no presente momento eu estou diminuindo o tratamento mais promissor á minha reabilitação em virtude da falta de capital para investimento.
Para não perder o que eu havia ganhado no tratamento em São Paulo eu comecei a fazer musculação adaptada. Como eu não tenho o movimento de pinça, eu uso de luvas especiais (meu pai é esperto, gente!) para conseguir segurar nos ferros.

Lembrei-me novamente de uma frase popular. Essas frases resumem pensamentos sociais que levaram séculos para serem minimizados em uma só frase.
"Só reconhecemos o valor das coisas quando as perdemos".
Você, leitor que anda, se move, é fisicamente independente, você não sabe MESMO o quão abençoado é um movimento voluntário.
Você escolher sair da frente do seu monitor, ir andando até a cozinha, pegar no armário um copo, abrir a geladeira, encher o copo e com a mão levar o copo até a boca, apreciar o friozinho da água acabar com sua sede ou com seu tédio.
De verdade, EU sei o valor disso.
Eu sei.

Foco e calma.

Provavelmente alguma vez n vida você já ouviu a frase "De grão em grão a galinha enche o papo".
Sabe o que ela quer dizer?
Diz respeito ao ato de economizar para assim obter algo que vá lhe satisfazer.
No entanto, nesses dias que se passarão, encontrei uma outra explicação.
Para mim esses ditado também fala sobre persistência e paciência. Ora ora, para a galinha encher o papo de grão em grão vai tempo, heim?!

Ultimamente estou assim. Não como um galinha, óbvio (rs rs). Estou calmo, com foco, persistente no que me dispus a fazer: Minha reabilitação.
Os exercícios apresentam resultados de forma lenta, porém são promissores.
A lentidão, sendo bem sincero, frusta, no entanto é uma frustação bem menor do que a de não andar.
Exercícios que doem, dinheiro que falta, o tédio, a dependência, tudo frusta, mas nada mais me desmotiva, porquê agora eu tenho uma meta a ser atingida: Melhorarei por mim e por todos aqueles que lutam junto comigo.
Cada sucesso, seja ele um pequeno movimento nos dedos na mãos, ou até um movimento voluntário na perna, são alavancas que junto com o amor que ganho de muitas pessoas, me impulsiona para a felicidade e realização.
Agora com essa calma e persistência que a vida, nesse momento tão duro, me ensinou a ter, eu lhes digo com toda a sinceridade que só pararei de lutar quando meu coração parar de pulsar.

Wednesday, June 15, 2011

Luta

Minha rotina agora é toda voltada para a minha recuperação.
Lutar e me esforçar é o mínimo que posso fazer diante todo o esforço que vejo minha família e alguns amigos fazerem por mim.
Sei que podem pensar que só porque estou com os movimentos limitados não consiga sentir os músculos. De fato algumas partes eu não sinto, mas as que sinto doem de forma descomunal nas fisioterapias.
A dor nesse instante não é sofrimento, pelo contrário, é alegria, pois melhor a dor que não sentir coisa alguma.
Vai por mim, eu sei muito bem o que é não sentir doer e sofrer por isso.
O músculo que mais dói ultimamente é o coração.
Eu vejo, eu sinto e percebo os progresso lento, mas existente, que tenho em todos os exercícios que faço, no entanto o coração se angustia com a demora, com os outros sentimentos que uma pessoa nessa mesma situação que eu começa a lidar.
Se você que está lendo não sabe do que estou falando, mencionarei alguns: Sentimento de Impotência diante as situações, muitas vezes de negação. Sentimento de total responsabilidade pelo quadro que está e pelo quadro que almeja alcançar.
O sofrimento no coração existe e existe nele também a esperança, o amor de todos a minha volta, o meu amor-próprio.
Os sentimentos quentes estão ficando mais fortes que os gélidos sentimentos angustiantes, e é isso que me dá forças de conseguir mexer minimamente um membro adormecido.

Palavras de apoio não me faltam, infelizmente o que me falta é capital para que eu possa aderir aos tratamentos que propõem melhores resultados.

Esses dias atrás meu pai comprou uma Tv a prestação e agora estamos rifando-a.
O dinheiro será revertido para o início de um tratamento que me dá chances significativas de voltar a passear com minha cachorra, fazer uma caminhada com meu irmão, voltar a ser mais independente, me permitirá bater uma bolinha com meus amigos.

Viver é de fato uma luta, uma guerra que travo todo o dia contra essa condição que estou, buscando voltar a condição que eu estava.

Tuesday, June 7, 2011

Motivação

Provavelmente você já ouviu ou viu aquelas frases bonitas de comercial, de músicas motivadoras, aquelas que dizem "nunca desista", "você é capaz de tudo!"

Lembro-me que antes dos acontecimentos que agora me prendem na cama ou na cadeira de rodas, eu não prestava muita atenção nessas frases.
Teve um tempo que eu até desacreditava delas, eu pensava "Certamente quem diz isso consegue ir atrás, andando, das coisas que quer."
Eu via na internet aqueles camaradas que se ferraram legal na vida, nasceram sem membros ou com algumas síndromes e mesmo assim seguem uma vida normal, que a grosso modo é uma vida espetacular, pois a normalidade da vida é oposta as dificuldades que ela mesmo impõe para ser normal.
Mas mesmo sem motivação e muito frustrado da vida, eu não desistia das fisioterapias e de todos os exercícios.
Sou adulto, sempre foi compreensível ver os meus pais saírem de perto de mim para falarem de contas. Eu tenho noção que todos os meus tratamentos envolvem dinheiro, dinheiro que não temos.
Meu pai que havia se aposentado voltou a trabalhar, meu irmão mais novo trabalha e ajuda muito não gastando nada dos meus pais. Minha mãe anda para lá e para cá atrás dos benefícios que um deficiente pode ter na sociedade.

Se um dia lhe disserem que são as dificuldades que vão nos tornando mais sensíveis, pode acreditar.
Fui me sentindo mal ao ver todo mundo ao meu redor batalhando por mim e eu isolado na minha tristeza.
O principal beneficiado será eu, logo eu tenho que ter forças, eu tenho que criá-las quando elas estivarem sumindo.
Percebi que agora eu sou o responsável por minha melhora, que as tratamentos sãos ferramentas essenciais para minha melhora, no entanto eu que tenho que batalhar!

E agora eu afirmo: Se você não lutar provavelmente não perderá, mas certamente nunca vencerá!

Thursday, May 12, 2011

Qualidades e defeitos.

Tenho a impressão que os anos que passam acabam que acentuando meus defeitos e diminuindo as minhas qualidades.
Talvez porque eu de fato seja os meus defeitos, que só são defeitos porque demais pessoas os vêm assim e falam isso. Penso que não temos defeitos, somente características, jeitos de interagir com o mundo.
O olhar do outro, ou o olhar para si mesmo,que dá a conotação de bom ou ruim para tais características.
Mas voltando aos defeitos e as qualidades...
Sinto que minhas qualidades eram somente os meus defeitos ainda não muito bem estruturados.
Meu romantismo era a manifestação da minha extrema carência.
A simpatia, expressão de baixa auto-estima.
A força, armadura para a vulnerabilidade.

Talvez eu tenha admitido os defeitos e assim tenha os tornado enfim as minhas características, partes integrantes da minha personalidade. Quem sabe também eu tenha me cansado de tentar impressionar e passei a apenas viver.

Bem, não sei ao certo o que me aconteceu, só sei que tudo isso me faz pensar em uma só frase:
"Admitir-se é o primeiro passo para entender o mundo."

Saturday, April 30, 2011

Sarah Kubitschek

Já faz algum tempo que eu estou em casa, no meu quarto, vendo muitas pessoas vindo me visitar. Entre orações e pedidos de melhoras, os olhares dos meus amigos, vizinhos e colegas se alternam entre esperança, medo, pena e espanto.
Meus pais cuidam de mim, fazem coisas que havia deixado de fazer há muito tempo, como me dar comida, por exemplo.
Pesquisamos tratamento e com muita sorte e persistência conseguimos uma vaga para mim no Hospital de Referência em Reabilitação de lesão medular Sarah Kubitschek, em Brasília.
A ansiedade tomou conta de todos que estavam em minha volta, no entanto me restringirei a descrever a minha.
Sempre quis viajar de avião, mas nunca imaginei em tais condições, para tais fins.
Nenhuma pessoa, nenhuma família, programa sua vida e seu orçamento com um ponto na lista dizendo "fundo caso catástrofe", ou seja, não foi fácil conseguir dinheiro de última hora para comprar as passagens e pagar a hospedagem da minha mãe.
Família, novamente, ajudou, compreendeu e se uniu.
Meu pai levou a mim e minha mãe ao aeroporto, meu irmão também foi.
Recebi beijos e abraços dos dois enquanto minha mãe estava atrás da cadeira de rodas para me empurrar.

Olhei fixamente para o meu irmão. Ele tinha 15 anos, estava na fase de querer usar algumas roupas minhas para sair, mas elas ainda ficavam grande.
Ele me falou para sarar logo, que tudo vai dar certo e eu senti um pingo de tristeza na voz e decidi que não o deixaria mais triste, eu iria vencer para fazê-lo sorrir.

Entrei no avião, que sensação incrível! Todo mundo ficou pequeno lá de cima, parecia uma paisagem panorâmica de Sim City.
Aterrissagem tensa, impacto forte, treme tudo!
Agora estou em Brasília, um novo mundo para mim, para dar início ao meu caro e árduo tratamento para que eu volte a viver no meu velho mundo, aquele que eu jogava futebol de rua com meus amigos, ia para a faculdade e não preocupava as pessoas.

Tuesday, April 19, 2011

No quarto.

Era exatamente 15:00h do terceiro dia de auto exílio.
Na sala havia um homem sentado em um sofá cor de abóbora, aquelas "poltronas do papai". Em seu lado esquerdo havia um criado mudo que tinha como único objetivo de existência servir de lugar para o homem por seus óculos.
Os pés do homem estavam em cima de alguns livros que ele costumava ler quando ainda estudava. Os livros descreviam traços de personalidade inflexíveis, transtornos mentais, comportamentos e tratamentos.
"Eu poderia ter sofrido menos se soubesse de tudo isso antes" - pensou o homem.
Frase cômica, considerando que naquele exato momento ele chorava. Não era um choro escandaloso, daqueles que tem berros e cenas teatrais com as mãos, mas daqueles choros que só se vêem as lágrimas e só se sente o sofrimento ao observar o indivíduo.
Ele se abraçou no momento que cedeu a dor.
O homem passou a mão na barba de quinze dias, arrumando-a, e em seguida secou os olhos por debaixo dos óculos de armação azul.
Ele saiu da cadeira e foi até a porta, colocou a mão na maçaneta mas preferiu direcionar-se para o banheiro.
Lá ele viu quanto a tristeza mata a beleza, a juventude.
Ele não era feio, ele estava feio. Seus trinta e cinco anos parecem ter passado há vinte anos atrás. Seu roupão cinza escuro ajudava a confirmar a aura gótica em que ele estava inserido.
Passou água no rosto, molhou os cabelos e escovou os dentes. Ele não tinha acabado de sair da cama, ele estava somente tentando acordar, pensando que ao repetir o ritual matutino a sua mente interpretasse que estava na hora de começar a fazer o dia acontecer. No entanto não deu certo, em vez de se sentir mais vivo, sentiu-se apenas molhado.
Voltou para o sofá e antes de sentar-se tirou do assento um caderno de capa verde surrada. Na capa via-se escrito com letras de mão " Lembranças - 2001".
_É a terceira vez que eu leio isso... que merda!
Falou e ao mesmo tempo foi abrindo.
Na primeira página havia um breve prefácio, escrito:
"Eis aqui a tentativa de através das letras transportar para o papel o que me aflige o coração."
Continuou a folhear para relembrar quem ele era, o que ele era, naquela época.
Na primeira linha estava escrito "15 de junho".

Tuesday, April 12, 2011

Sociedade

Já pararam para pensar no quanto somos falsos com nós mesmos?
Nos seguramos, nos mutilamos internamente para não sofrermos mutilações externas.
A cada dia existem mais pessoas que entram na academia para emagrecer, mas que na verdade quer aquela picanha com uma cerveja gelada para acompanhar. Temos também moços dizendo amar, mas na verdade só querem transar ( me falem aqui qual relação afetiva, fora a familiar - e há excessões ainda!! - que não tenha conteúdo sexual). E as meninas, que também querem a mesma coisa, mas se revestem de sentimentos e condições sociais para se deixarem levar pelo desejo.
Até o desejo, coitado do desejo, se tornou um pecado em virtude das convenções sociais!
Agora me coloco a afirmar que a incongruência surge quando a vontade interna, do self, não condiz com o julgamento de certo no contexto social em que o sujeito está inserido.
A mesma sociedade que é dita como a acolhedora dos sujeitos, é a sua pior megera.

Thursday, March 31, 2011

Meu quarto.

Já faz algum tempo que eu voltei para casa e a unica parte que eu exploro é o meu quarto, exploro visualmente ainda, não saio da cama. Não é que eu queira isso, é que meu corpo não se move, o acidente foi mesmo grave.
Pelo o que o médico disse, ocorreu uma espécie de chicotada na minha medula espinhal, ela inchou em uma determinada parte e isso atrapalha o caminho que as correntes elétricas percorrem para realizar os movimentos. Ele também me disse que o meu quadro é reversível , ou seja, eu posso voltar a andar, isso só depende da diminuição do inchaço e da estimulação que eu vou fazendo das partes paralisadas. Segundo o doutor, não dá para determinar quando o inchaço vai sumir, pode demorar um mês, um ano, vinte anos.

Vinte anos...

Essa estimulação é realizada através de fisioterapia, estimulações elétricas e outros tratamentos experimentais. E tudo isso, custa dinheiro, e não é pouco.

Já sou adulto, mas agora estou tão limitado quanto uma criança. Como é frustrante não conseguir limpar a própria boca, não conseguir pegar no colo a minha afilhada... Como ela é linda, sorri para mim, ao contrário da maioria das pessoas ao meu redor que estão com seus semblantes preocupados a minha volta fazendo novena para eu melhorar.
Quando eu cheguei fui levado de cadeira de rodas até o meu quarto e lá alguns parentes ajudaram meu pai a me por na cama.
Essa cena, de ser posto na cama, pode ser algo engraçado quando se tem vinte e poucos anos e acaba de chegar chapadão de uma festa, mas esse não era o meu caso.
Pisco e volto a mim, saio dos meus pensamentos. Estou de volta no na minha cama e ao meu lado está minha mãe me perguntando se eu quero comer, pois caso queira ela traz e me serve.
Mesmo diante dessa minha situação eu tenho esperança e força de vontade que um dia eu voltarei a falar para ela "Espera, mãe, já vou."

Wednesday, March 23, 2011

Melancolia

Entrando pela janela era possível ver a seguinte cena: Um sofá verde de dois lugares ocupados com uma caixa de pizza com sementes de azeitona dentro e um amontoado de papéis. No centro do cômodo havia uma cadeira com Voltaire, Rogers e Pearls servindo como um dos pés que faltavam.
No chão havia um tapete lindo, marrom com tons de azuis formando losangos que eram cortados ao meio por retas vermelhas.
Paralelo ao sofá de dois lugares havia um sofá com três lugares e nele jazia um homem deitado.
Considerando a barba grande, a barriga saliente e o cabelo despenteado era possível dizer que ele tinha por volta dos quarenta anos, que era um daqueles ex-jovens hippies que esqueceu que o tempo passa à todos, mesmo para os mais alucinados.
Mas não. O homem deitado tinha nasceu na década de 80, do tempo que finalizar Street Fighter era iniciação adolescente.
Fazia uns dias que ele não saia daquele cômodo, só fazia isso quando precisava ir ao banheiro, que era na porta a sua esquerda, atrás do sofá.
Ele não queria mais ficar triste como estava, pensou em suicídio mas isso era radical demais, além do mais ele era vivido e estudado por demais para conseguir analisar os danos familiares que isso poderia causar, ele ainda tinha contato com a realidade.
Dando um diagnóstico para o jovem, ele havia se tornado um melancólico. Um pedaço dele foi enterrado junto ao amigo.
Quando ele se lembrava do amigo rindo ao seu lado minutos antes do carro dar várias voltas batendo no chão ele se contorcia, ficava em posição fetal, queria, ele queria mesmo, não ter nascido para assim não ter visto o amigo morrer.
Ele não se sentia culpado, completamente culpado, pois o amigo deixou claro que queria beber, pois era a sua última noite solteiro. Todos os amigos estava em um misto de alegria pelo casamento e tristeza pelo mesmo motivo. Ele seria o primeiro da turma a passar pro time de futebol que antes era formado somente pelos pais deles.
Lágrimas desceram e molharam seu rosto barbado. Era difícil para ele lidar com o choro ao lembrar do sorriso do seu amigo.
"Cara, entenda uma coisa, tudo que está vivo morre, isso é inquestionável e inevitável", era isso que seu amigo sempre dizia, mas precisava ser com ele, justo agora? Justo tão cedo?
O jovem secou as lágrimas e pensou que não podia ficar daquele jeito, afinal o amigo lhe deixou bem claro durante todo o tempo que viveram juntos que a morte não impossibilita os que estão vivo a continuarem vivendo.
Ele virou pro outro lado e se encolheu um pouco mais, forçou os olhos e tentou esquecer esse ensinamento do amigo. Ele não queria lembrar disso, pois a dor era maior que a razão.

Thursday, March 17, 2011

Tristeza.

Jonas não estava num dia bom. Muitas preocupações, daquelas que parecem ser necessidades para ontem, apesar de faltar ainda alguns dias para serem de fato atendidas, apresentadas.
Haviam algumas desilusões também, as de relacionamentos, dos mais diversos relacionamentos, desde o familiar, passando pelo trabalho e enfim chegando ao amoroso (ou a falta dele).
Ele não estava bem mesmo, estava cabisbaixo, com poucas palavras e expressões. Dificilmente se alegrava, estava sempre no amanhã, no triste e penoso amanhã. Pensava no amanhã porque o hoje, para ele, já estava perdido, morto e enterrado.
Ele tentou por a culpa nos outros, na família, nas meninas, no trabalho. Olhou em volta e viu pessoas conversando, outras rindo e se abraçando. Viu meninas se deixando levar pelo papo do rapaz e este sendo apenas cavalheiro. Olhou para o outro lado e viu dois colegas planejando o futuro, os trabalhos, o que fariam e de que forma.
Foi aí que ele percebeu que o mundo não havia parado e nem estava escuro, como o mundo dele estava naquele momento. E mais, ele percebeu que o mundo não parou só porque ele estava triste. Tudo continuou, em plena harmonia.
A tristeza dele atingia somente a ele. Tal sentimento repeli as pessoas, a aproximação existe ou por pena ou por curiosidade, porém não dura muito tempo, pois a tristeza é vista como um vírus contagioso, as pessoas nunca querem ficar assim.

Obviamente que essa não foi a cura das suas dores, mas ao menos iniciou-se o processo para tal, pois a observação o fez compreender que essa tristeza que ele sentia era nada mais que um sentimento egocêntrico que o levava ao um ciclo vicioso de vitimização.

Wednesday, March 16, 2011

Saudade.

Fico pensando o que nos provoca a saudade. Será a ausência do outro ou das atitudes do outro?
Me pego pensando em abraços, beijos, carícias mil. O calor e a maciez da pele, o cheiro dos cabelos, o tato no corpo.
E as conversas, aquelas que duram horas e horas e ao final dela se chega a conclusão que, sendo bem sincero, não falou-se nada de tão interessante, apenas conversou, jogou conversa fora.
Ligações que duram quarenta, cinqüenta minutos, que acabam com aquela briguinha de quem desligará primeiro.
O ciúme, aquele sadio que todo o ser humilde e apaixonado tende a ter.
Pensei na no jogo de sedução e como isso é belo. Um detalhe na roupa da sua cor favorita já é motivo para elogios. Todo o processo, por vezes rápido e por outras demorado, com quase sempre resultado impecável. Uma jogada de cabeça ligeira para o lado e a pergunta rotineira "como estou, estou bem?" E dá - e pode - dizer que não?
Filmes assistidos em conchinha, carícias nos cabelos enquanto se falam...
Agora voltando... A saudade está direcionada à pessoa que proporciona toda essa felicidade ou às ações propriamente ditas? Será que fazemos uma relação Sujeito-ação que nos faz "pensar" que sentimos falta do outro, não de suas ações?
Sabe, na verdade eu não sei o porque de eu estar racionalizando tudo isso, pois na verdade o que eu sinto é falta de disso.
Verdade, sinto falta disso.

Friday, March 11, 2011

_ Deus não existe!
_ Como assim, não existe?
_ Eu lhe digo com toda a certeza que não existe!
O moço piscou e sorriu. Colocou a mão no ombro do amigo e disse:
_ Em que você se baseia para dizer isso?
_ Na ciência, meu caro! Não há provas concretas da existência de Deus! Todo o ecossistema funciona sem intervenção externa. Não há indícios da existência de Deus!
_ Bem... Não conseguir provar a existência de Deus só quer dizer que não conseguiram provar, e não que ele não existe! Talvez por falta de ferramentas, ou por métodos usados, não conseguiram provar a existência ou não de Deus. No entanto, meu amigo, a unica coisa que sei até hoje é que não conseguiram provar nada.
O amigo ficou sério, perplexo e frustado em perceber que seu amigo estava até que certo.

Tuesday, March 1, 2011

Survivor.

"Por volta das quatro da manhã." Foi isso que pensei quando vi o relógio. Já era hora de dormir mas eu estava lá, conversando e rindo da vida.
Os amigos quiseram ir comer e eu imediatamente aceitei. Desci a rua e freei para fazer o balão. Ao lado direito uma luz xenon cresceu em meu retrovisor e ouvi os pneus alheios cantando ao lado do meu carro. Instintivamente pisei no freio, o que não adiantou muito, pois ele era ruim e faz o carro dançar. Essa dança levou a lateral bater de raspão num poste, que fez o carro dançar mais, bater na calçada e virar de ponta cabeça.

Foi assim que morri.

Wednesday, February 23, 2011

Parece-me natural do ser humano sempre buscar a auto satisfação, independente da forma em que se procura, em qual fase da pirâmide estamos.
Estando com fome, necessitando de segurança ou de afeto ou até chegando ao ápice conseguindo amar o outro como a si mesmo, olho e percebo que cada um tem o seu próprio mundo e é neles que pensamos quando tomamos qualquer atitude no mundo social.
Será que esse é um pensamento egoísta, achar que tudo que fazemos, mesmo a atitude mais altruísta, é algo buscando a satisfação própria?


Digno de pensamento.

Sunday, February 20, 2011

Sorriso, eis uma ação que encantava. Quando era visto despertava os mais variados sentimentos. Começava a imaginar como seria ver esse sorriso de perto, tentar, ao menos tentar tocar as bochechas que subiam quando o sorriso estava existindo.
Como um insight pode mudar tanto uma percepção? Um dia, inesperadamente foi perguntado sobre um outro. Em suma, o outro não era o questionado, mas o questionador.
Simples assim, gosta-se de outro, não desse. Fácil de entender que os sentimentos alheios não são direcionados para onde gostaríamos que fossem.
No entanto a idéia de morte também é simples, sempre ouvimos sobre a morte. E mesmo assim, a gente se acostuma com ela?

Acostuma-se com a quebra de ilusão?

Saturday, February 19, 2011

Anos perdidos

Eu estava distante daqui, dos compromissos que antigamente eu zelava com esmero.
Estava ocupado, cuidando das leituras, das preocupações, das contas e dos empréstimos. As pessoas passavam por mim, me cumprimentavam e eu ligeiramente dava-lhes um oi, mais por etiqueta que por carinho.
E assim fui vivendo pensando estar progredindo no caminho.
Então me dei conta... Passaram-se anos!
Onde estavam meus amigos? A paixão, o tesão pela vida? os parceiros de piada, de cerveja, as gurias para amar?
Me preocupei com as coisas secundárias e não me ocupei das primárias, que era a minha vida presente!
Honestamente, é de entristecer reconhecer que sou o culpado pela minha perda dos anos, mas antes a tristeza que a não oportunidade de entristecer-se!

Tuesday, February 8, 2011

sentindo.

Para o universo não existe relógio. Existe sim o tempo, mas engano certo pensar que o mundo é regido por nosso tempo térreo de horas, minutos, segundos, dias e noites.
Segundos minhas contas haviam se passado duas ou três semanas. Nesse período não houve comunicação ou manifestação de qualquer sentimento de ambos os lados.
Não que isso me incomode, creio que escrever sobre isso darão jargões interessantes mais a diante.
Diálogos frios foram os últimos, meu lado era agressivo, o dela, não sei descrever quais eram suas reais intenções.
Quando eu tinha dezessete anos eu escrevi um texto e umas das frases eram "Temos duas opções: ou nos fazemos existir, ou morremos." Fazem cinco anos que a frase existe e inexplicavelmente ela não perde o sentido.
E é exatamente isso que estava acontecendo, eu estava morrendo para ela. No entanto, o que me conforta é saber que enquanto eu morro para ela, ela também morrem em mim.

Tuesday, February 1, 2011

Relato paterno.

Hoje foi um dia abençoado. Depois de oito longos dias meu filho abriu os olhos, saiu do coma.
Lembro-me como se fosse ontem o que aconteceu já há algum tempo. O telefone tocando a noite a voz do outro lado dizendo "Sofremos um acidente, o Dani não está muito bem". Mais do que depressa peguei meu carro e fui onde o carro batido estava. Quando cheguei já haviam levado meu filho para o Hospital. Os para-médicos que lá ainda estava me disseram que meu filho havia se machucado muito, a orelha cortou e ele estava desacordado. Fiquei feliz em olhar em volta e não conseguir ver nenhum saco preto em minha volta.
Um dos meninos que estavam no carro me entregou uns retalhos e disse que eram do Dani e que cortaram para facilitar o atendimento. AS calças rasgadas e tingidas de vermelho. A jaqueta do seu curso com o emblema sujo de sangue. Chorei nas roupas, confesso sem vergonha nenhuma que eu chorei.
Volto a atenção ao meu filho, ele está de olhos abertos e resmungando, estava com dificuldades para falar. Ele deu um grunido, não consegui entender se era de dor ou de qualquer outra coisa.
Me senti pequeno, minúsculo, impotente diante ao momento. Eu sou pai, me sinto na obrigação de amparar meu filho, mas o que eu era agora? Um fraco diante toda essa situação?
Meu filho tenta se mexer e olha desesperado para a mãe e para mim, buscando pelo olhar alguma ajuda, alguma explicação.
Tomei fôlego e disse:
_Filho, as coisas mudaram agora, mas seremos fortes, nós vamos sair dessa juntos.

Wednesday, January 26, 2011

Capítulo I

Estávamos todos preparado para mais um dia de festa. Como é bom fazer faculdade, não só por saber que está, pela primeira vez, estudando algo que realmente gosta, mas também pelas festas, pelos amigos, pelas belas garotas que passam pela portaria enquanto você espera os amigos para irem ao bar enquanto esperam o horário da perua sair e finalmente irmos para casa.
_Tá pronto, Dani?
_Nasci pronto, camarada!
Desta vez fomos de carro e a saída da faculdade não tinha como destino nossas casas, mas sim uma festa! Que bom é ser universitário!
Lá chegamos e logo percebi o porque de eu ter gastado quarenta reais para entrar na festa. Lá se via alegria, garotas, mais garotas, meus amigos, as cervejas trincando de gelada, a música que convidava uma dança a dois.
Para esquentar o espírito nada melhor que uma cerveja gelada. De gole em gole tudo vai ficando mais belo, parece que as pessoas começam a gostar mais de você, as meninas começam a piscar, a vida fica mais simples de ser vivida.
Acompanhei o som que tocava e os amigos que bebiam.
Já era 4:05 am, estava tarde, era necessário ir embora. Na hora eu até pensei na bronca que minha mãe daria por eu ter matado aula, mas eu sou adulto, já sei me virar.
_Deixa eu ir no banco de trás que eu tô podre de sono, galera. - falei para os meus amigos que consentiram.
Eu estava com sono e resolvi dormir. Como estava no banco de trás ficou mais fácil para eu deitar. Tentei deitar e o cinto me impediu, então tirei o cinto, na parte de trás os riscos são menores.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
Não sei ao certo que dia que é hoje. Estou meio atordoado com o clarão que as luzes florescente fizeram quando eu abri os olhos.
Perguntei o porque de eu estar ali e me disseram aos prantos que meu amigo dormiu ao volante e bateu de lateral em um carro. Meus dois amigos estavam lá, me olhando. Um com o braço quebrado e outro com um tampão no olho.
Meu amigo que dirigia o carro veio ao meu encontro e chorando pedia milhares de desculpas. Eu falei para ele relaxar e fui erguer a mão para cumprimentá-lo. Foi então que entrei em choque. Minha mão não se levantou, meus dedos não mexeram, meu braço sequer fez algum movimento. Tentei me sentar e não senti as pernas. Abri a boca para falar algo e olhei para minha mãe, ela chorava como todos que me olhavam em volta da cama.
_Daniel, meu filho, você está machucado.
Não era só machucado, eu estava paraplégico.

Thursday, January 6, 2011

Pense nisso.

Aprendi uma coisa faz tempo já, acho que eu tinha por volta de uns 13 anos. Lembro-me quando, para mim, consegui desvendar a expressão em que se dava o entendimento de algo.
Segundo a minha teoria (vivemos criando isso o tempo todo, né?)uma ação, alguma coisa que acontecesse no mundo, tinha uma visão extremamente pessoal, ou seja, quando vemos alguma coisa ou passamos por algum momento o entendimento do mesmo vem diante todo o nosso modo de viver, de ser educado, dos sentimentos que nos produz, dos nomes que damos à eles, o nosso humor.
Para exemplificar: Acontece algo que para você foi desagradável. Por que será que foi?
O seu modo de entender, de ver e de sentir tal fenômeno é o que torna a situação desagradável, não o fenômeno em si.
Toda a ação é somente uma ação sem interpretação. As qualidades delas são totalmente pessoais e subjetivas. Até o entendimento coletivo não é unânime.
Lembro-me que quando consegui ver isso fiquei muito feliz. Lembro que eu fiquei pensando que isso é que era crescer, virar adulto, ao meu ver ser adulto era conseguir ver uma atitude sobre vários focos, não só sobre o próprio.
Quando alguém fica extremamente nervoso com você e você não consegue compreender. É o modo dele de sentir que faz enfurecer, não é culpa sua.
Aliás, há um pouco de culpa sua também, pois em uma relação não há vítimas, só réus.
Então quando ver alguém falando de algo de algum momento da vida, faça o treino de tentar entender pelo outro o que o faz perceber tal momento daquela maneira.
Como diz uma amigo meu: "Pense nisso."

Tuesday, January 4, 2011

Lembranças.

Os raios de sol iluminam o pequeno quarto pelas frestas da armação de madeira da janela. Os pais já não estava em suas camas, somente os filhos que lá permaneciam.
A menina mais velha acorda e coçando os cabelos vai para sala, olha em volta e não acha a mãe nem o pai. Como de hábito infantil, grita o nome dos dois e é atendido pelo pai. Corre em direção a voz e vê o pai no quintal colocando um pano xadrez em cima da velha mesa. A menina sorri e volta para o quarto e acorda seus irmãos menores.
_Jana, Jé, hoje é dia de churrasco!
Os gêmeos acordam num instante e já saem gritando em direção ao quintal. No meio do caminho encontram com a mãe e um saco com muitos pães. Eles começam a pular e a gritar de alegria e a mãe num tom autoritário exigem que as crianças escovem os dentes antes de qualquer outra coisa.
Depois da higiene bucal, de lavarem os rosto e trocarem de roupa as três crianças vão para a sala, assistem desenho na TV preto e branco. A TV colorida já existia, mas nesse tempo tudo que era novidade era comprado via consórcio, coisa cara.
A criança mais velha é chamada pela mãe na cozinha e começa a ajudar no preparativo do vinagrete. A menina mais nova se voluntaria a fazer alguma coisa e a mãe pede para ela passar um pano na casa. A pequena pergunta para o irmão gêmeo se ele fará alguma coisa e ele não responde, está muito concentrado no desenho para ouvir qualquer outra coisa que não seja do universo da fantasia.
A família ouviu uma palmas lá no portão da frente. O patriarca foi atender, era o seu tio.
As crianças vão correndo ao encontro do homem velho, de bigode e cabelos brancos.
_Tio Avelino, Tio!!!
Todos pedem a benção do senhor e o pequeno ajuda o tio com as Cocas-cola de 1 litro.

A mesa já está pronta, tudo está posto sobre o pano xadrez, desde os refrescos até os pães, rúcula e vinagrete.
A moda de viola toca na vitrola, mas a música é somente plano de fundo diante o papo em alto tom dos descendentes de italiano. Falam do passado, pro presente, da política, dos parentes, das saudades, dos objetivos.
A mãe cuida para que o menino não se engasgue com o sanduíche que fez e ao mesmo tempo coloca coca-cola para a outra pequena. A menina mais velha está comendo uma asinha de frango num canto, com a boca toda suja.
Logo depois de comerem as crianças vão brincar, ficam pela terra na frente da casa. Os adultos continuam a conversar e a mulher já começa a limpar tudo, menos a churrasqueira que é de responsabilidade dos homens.

Isso não é um sonho, tão menos uma crônica. É uma lembrança, dos domingos da minha infância.